TDLMG – Método de Leitura Estrutural

TDLMG – Método de Leitura Estrutural

Pintora Sul-africana: Sasha Hartslief;

Depois de todo esse tempo percebi que precisava voltar a postar textos sobre filosofia robusta já que a filosofia para o ensino médio não está acostumada a encarar textos, nem mesmo de blogs pequenos como este. Tão logo me vejo na postura de alguém que quer continuar alimentando este espaço, mas não quer que o conteúdo seja mais tão acessível quanto outrora. Por isso, irei postar textos que vão além dos vídeos, mas que são sobre o conteúdo dos vídeos postados nessas últimas três semanas.

1. Método de Leitura Estrutural – Macedo Jr.

Inventei de revisitar os textos da minha graduação em filosofia e de repente me deparei com um texto técnico, porém profundo, a respeito do método de leitura estrutural do prof. Macedo Júnior. A pergunta “Você sabe ler?” não é o tipo de questionamento que um aluno de filosofia gostaria de escutar, considerando que quando se trata de uma disciplina que não lê apenas textos de sua área, mas que mescla conhecimentos de humanas, exatas, linguagens, biológicas, robótica, teologia e tantas outras a serem descobertas. A filosofia é conhecida como mãe das ciências não é por acaso, afinal, enquanto filósofos, somos amantes da sabedoria e sabemos muito bem que para saber é necessário estar atento a todos os conhecimentos disponíveis.
Agora, apesar de todo esse discurso, a pergunta precisa ser respondida, a resposta mais coerente seria aquela que apela para a alfabetização, eu fui alfabetizado, então certamente sei ler, e é claro que sabe ler, mas você possui método de leitura? Ou você apenas lê, marca algumas coisas com uma caneta e acha que é o suficiente? A leitura precisa de dois elementos importantes, o primeiro está contido na memória e o segundo está contido naquilo que nos auxilia na memória, foco.

1. Foco e Memória

Iniciando pelo óbvio, ler um texto ou um livro demanda atenção, é muito difícil memorizar algo que você não foca o suficiente, para focar você pode aprender a cronometrar o seu tempo de leitura ou, pelo menos, fazer exercícios que te façam fortalecer sua atenção, praticar algum esporte, criar um sistema de recompensa, existem muitos rituais que podem ser cumpridos para que o foco seja melhorado, por exemplo, pegue um objeto, fique olhando para esse objeto por 5 minutos, bote o celular para despertar quando acabar os 5 minutos, foque o seu olho fixamente no objeto. Para cada momento que você desviar o olhar marque com uma caneta em um caderno, faça um traço simples e continue focando até terminar o tempo. Se o seu caderno tiver mais riscos do que o rosto de um trapper você precisa melhorar o seu foco e isso pode ser feito fazendo esse mesmo exercício todos os dias, uma vez por dia, até que o seu foco esteja bem treinado, ou se desafie a aprender a tocar um instrumento musical, ou praticar meditação. Agora, para melhorar a memória sugiro que compre um livro de exercícios para a memória do autor Dominic O’Brien, os livros dele não necessariamente aumentam a sua capacidade de memorização, mas te dá exercícios para que você aprenda a memorizar e até mesmo descobrir que a sua memória é saudável.
Ok, para ler é necessário foco e memória, alguns dentre vocês já praticam e exercitam essas coisas ao cultivarem um bom hábito de leitura não viciado, digo não viciado no sentido de mesclar gêneros de leitura, pegar textos mais pesados e depois mais simples, enfim, ler um texto filosófico é ser confrontado com diferentes gêneros, com uma escrita complexa e um encadeamento de ideias não natural. A leitura estrutural é um método que parte do princípio que o texto é um sistema coerente de argumentos, conceitos e proposições, em outras palavras, o texto responde as perguntas do próprio texto, existem pessoas que gostam de ler e na hora de explicar o que leram elas inventam e deduzem ideias, a leitura estrutural repudia esse tipo de atitude, não porque o leitor não pode pensar por si só é mais porque para que haja capacidade crítica de observação é necessário demonstrar que você sabe bem o que foi lido. É como se o leitor de filosofia enquanto encara o texto ele suspendesse o juízo para compreender com profundidade o que está ali.

2. Leitura

A profundidade é alcançada a partir de uma suspensão temporária do juízo para que o tempo lógico de argumentação do texto seja evidente. Tão logo a interpretação de um texto filosófico está voltado para a compreensão das intenções textuais do autor, uma análise do movimento coerente, construtivo e sistemático do texto. A leitura estrutural pressupõe foco no processo de transformação das ideias ao longo dos parágrafos.
A nossa educação filosófica no ensino básico é totalmente voltada para a história da filosofia, claro que isso tem mudado, porque hoje em dia é muito mais fácil ler um livro de filosofia que aponta os problemas filosóficos do que para os autores que formularam as respostas, no entanto, todos nós em algum momento fomos apresentados para a filosofia antiga, medieval, moderna e contemporânea ocidental, pois a apresentação da filosofia precisa em certa medida ter consciência de sua própria história, no entanto há quem diga e eu sou um deles, que filosofia só se aprende com livros. É muito difícil fazer com que os alunos de ensino médio e fundamental peguem um livro como Livre Arbítrio de Schopenhauer e isso os faça refletir para levantarmos grandes questões em sala de aula, assim nossas aulas se tornam debates, discussões, ou até mesmo apresentações de história da filosofia, mas nunca uma filosofia profunda e instigante e, como que por ironia, essas aulas podem se tornar totalmente inúteis, monótonas e chatas, o debate e a discussão nunca levam a lugar nenhum e a apresentação da história da filosofia é só mais conteúdo para o estudante decorar até a prova. Nisso não há deleite, já que a filosofia aqui é uma apresentação sem comprometimento, logo sem amor.
O texto nos obriga a termos um foco especial sobre determinadas questões, a leitura é necessária a todo tipo de conhecimento, ela exercita foco, memória, atenção, interpretação e raciocínio, ler filosofia é desenvolver aptidões espirituais, ou seja, sensibilidade ao essencial.

2.1 Leitura: Técnica Superficial

O autor em questão oferece três níveis de técnicas para o desenvolvimento de uma boa leitura, o primeiro nível, uma leitura rápida de averiguação com 9 pontos: 1. Se for um livro, sempre consulte o índice, não seja ansioso na leitura, compreenda o objetivo do livro pelo índice que ele apresenta; 2. Tenha atenção aos inícios e aos fins, de parágrafos e de textos, pois muito do que é desenvolvido está apresentado no início e as conclusões do final precisam se conectar ao início; 3. Não pule prefácios e introduções, tenha atenção ao que é dito; 4. Exercite a busca de palavras-chave, veja a palavra que parece ser central para compreender o argumento do parágrafo, ou da frase; 5. Marque o texto, mas não marque todo o texto, uma leitura ativa envolve conversar com o texto, mas não invente de ficar marcando todas as linhas só porque tudo parece importante na primeira leitura, lembre-se que você está reconhecendo a obra agora; 6. Não se preocupe com o que é demasiado difícil de compreender, apenas crie consciência do que você não sabe; 7. Leia o texto inteiro, programando uma releitura (Obs.: Nem todo texto, ou livro, comparta uma segunda leitura e isso comentarei no final); 8. Não deixe de se perguntar e sempre responda com clareza e honestidade: Do que o texto se trata? O que está sendo efetivamente afirmado? Quais são as proposições principais do texto? Quais são os subargumentos?

2.2 Leitura: Técnica Aprofundada

O segundo nível é uma leitura profunda, não necessariamente essa leitura é lenta já que no mundo ideal a primeira leitura tem a função de auxiliar a segunda, assim algumas partes do texto se tornam de mais fácil compreensão, outras partes você lembra com mais clareza e por isso pode pular o parágrafo, etc…, aqui há 13 pontos interessantes: 1. Em quantas partes o texto está dividido e quais são os critérios para essa divisão?Alguns textos já vem com essa divisão, estilo a bíblia, mas outros você como um leitor precisa ter essa noção, do parágrafo 5 até o 7 o autor está falando sobre epistemologia kantiana, essas coisas; 2. As justificações da divisão se encontram no texto?; 3. Enumere os argumentos do texto! ; 4. Defina em uma frase curta qual é o argumento de cada parte; 5. Leia com muita atenção o que é essencial ao texto, o argumento central; 6. Tenha objetivo na leitura, sempre tenha uma meta de conhecimento para que a leitura não seja solta; 7. Qual é o tema principal e como ele se divide e subdivide?; 8. O que está sendo dito detalhadamente e por que o autor está detalhando tanto?; 9. Contra quem o texto foi escrito?; 10. Construa um esquema do texto para que haja familiaridade com o repertório conceitual do autor; 11. Seja humilde, mesmo que o texto pareça óbvio tenha a nobreza de encarar o texto em toda sua complexidade; 12. Procure o significado das palavras desconhecidas dentro do próprio contexto; 13. Não se prenda apenas ao método de leitura estrutural, busque outros métodos que possam te auxiliar.

2.3 Esquemas Lógicos e Topológicos

O texto do Macedo Júnior dá exemplos práticos de como exercitar essa leitura, mas uma coisa é importante ressaltar, a criação de esquemas para remontar o texto pode seguir dois princípios, um princípio lógico que remonta ordenadamente a tese central e as subteses do texto e o princípio topológico que ordena o esquema conforme ele aprece em um texto, quer dizer, em um texto nós sabemos que o argumento principal nem sempre se encontra na introdução, as vezes está no desenvolvimento e ai você pode escolher, ordenar o esquema seguindo como é apresentado pelo texto esclarecendo o movimento de construção dos argumentos ou reordenando as teses para que haja uma sequência clara da lógica argumentativa interna do autor. Esse tipo de elaboração não somente auxilia na interpretação, como pode servir de base para uma apresentação de seminário ou uma aula. Ao contrário de um fichamento, de uma resenha e um resumo, esse esquema evita impressões pessoais e não reduz a complexidade do texto, mas evidencia os pontos elencados pelo próprio autor das ideias.

3. Técnica Mista e dicas

Agora, nem todos nós temos o tempo e a paciência para encarar o mesmo texto duas vezes,e aqui temos o terceiro nível de leitura, que é a leitura mista, esse terceiro nível é lento e necessita de disciplina, porque envolve trabalhar mais com o texto, mas perder menos energia tendo em vista que ler duas vezes é muita coisa. É necessário ter uma leitura ativa, que copia os pontos importantes, conversa com o texto e busca as respostas a medida que as perguntas surgem. Leia sempre com uma caneta na mão e priorize leituras em papel, parece bobo, mas não é. O nosso cérebro cansa mais rápido com telas iluminadas porque ele se esforça para diminuir o canhão de cores que salta de nossos computadores e celulares, claro que hoje em dia temos as iluminações noturnas que tornam a luz dos aparelhos amarelada para que a vista nem o cérebro cansem tanto, mas ainda assim, a leitura em papel precisa ser prioridade, porque lendo em mãos você pode escrever, e escrita ativa mais neurônios úteis para a reflexão. O papel, mesmo branco, não força tanto o nosso cérebro a diminuir cores, e se o papel for amarelado o cérebro trabalha para adicionar cores que deixam a visão confortável para a leitura. Segunda coisa, não marque tudo que parece ser importante no texto, principalmente se você quiser ler apenas uma vez, porque se você marcar tudo no texto, no dia que você quiser resgatar uma ideia que parece ser importante, ao invés de você ser objetivo na leitura, você terá que reler o texto para descobrir o que realmente te chamou a atenção, por isso tenha um objetivo claro de leitura e marque somente o que está previsto nesse objetivo, se possível reescreva as marcações, além de te ajudar a memorizar o que está sendo dito, a escrita dos trechos te auxilia a não revisitar mais o texto quando você precisar fazer um trabalho.

Conclusão

Para a filosofia é importante compreender movimentos textuais de argumentação para remontá-los e verificar a consistência de uma tese textual, nesse sentido a filosofia se envolve com a busca pela verdade do autor presente no texto e não na história do autor, ou na falha moral, ou na resposta para a vida, mas na ideia defendida pelo autor. Interpretar bem um texto é saber escutar a música com o ouvido certo, com o critério adequado. A crítica pode acontecer, mas antes de tudo é necessário trabalhar a apreciação. E esse é o método de leitura estrutural, aquele que aprecia a estrutura com os instrumentos certos.